domingo, 2 de maio de 2010

Cadernos Marroquinos - 4º Dia

Foi um mesmo dia, depois de uma noite quase em claro vindos de Erfoud, onde tínhamos planeado dormir, mas onde não ficámos depois da história com Mustafa e Rashid.
Houve noite e nascer do sol. Não há melhor.
Dei graças por conduzir entre as cinco e as sete da manhã. Vendo os olhos do Ordep a quererem fechar, pedi-lhe o volante.
Companhia e luz na escuridão daquelas estradas desertas, a lua repousa finalmente. É um regalo para os sentidos perceber o sol a surgir, lentamente, por detrás daqueles montes rochosos e sem vida. Tudo começa, então, a beber cor, cheiros e formas.
Em silêncio, ia espreitando pelo retrovisor o sol que aparecia na traseira e enchia de um cor-de-rosa raro e meigo as rochas ali à volta. Egoísta, não disse nada aos outros. Mas também dormiam a sono solto.
O dia ia ser quente. Aproximávamo-nos da Argélia.
A meio da jornada e depois de muito subir e descer no sinuoso percurso do velho Alto Atlas, temos um furo. E agora, pá ?, entreolhámo-nos. O pneu subselente era velho, quase careca e estava um bocado vazio. Mas deu para o gasto e permitiu-nos chegar ao sopé da montanha onde nos esperava uma bomba de gasolina. Não tivemos que ficar encostados na berma à espera, como é frequente ver nas estradas marroquinas. Como iam demorar a concertar o pneu, aproveitámos para comer umas omeletes que um tipo fazia mesmo ao lado.
Debaixo já de um calor febril, ouvia-se o muezzin a chamar para as orações do cimo de um minarete. Celestial.
Continuámos depois, para perceber que há horas em que não se deve conduzir. As quatro da tarde são essa hora ! Só as kasbahs conseguem resistir àquele sol abrasador de morte, aquele maldito sol dos infernos ! Quando avistávamos essas velhas fortalezas árabes já não nos sentíamos tão sós, imaginando lá dentro a gente a deixar o calor morrer.
Disseram-nos que fossemos mais para sul, que íamos encontrar as dunas de Mhamid. Foi o que fizemos.
Chegámos à noite, no meio de um reboliço de cabras e miúdos aos pontapés que correm para ver os estrangeiros na terra. Mal parámos a carrinha, aproximaram-se uns tuaregues. Queriam negócio. Ofereceram-nos um chá e ouvimos o que nos vinham dizer. A troco de alguns dirhams, iam levar-nos ao deserto. Perguntámos o que era preciso. Nada ! disseram. Regateámos um bocado e acertámos o preço.
Apetecia-me levar um turbante. Entrei numa tenda, paguei e lá fomos.

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